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A dicotomia nos une ou nos separa?



Dicotomia é a divisão de um elemento qualquer em duas partes, geralmente contrárias, como a noite e o dia, o bem e o mal, o preto e o branco, o céu e o inferno. Com origem no grego dikhotomía, indica uma classificação que é fundamentada em uma divisão entre dois elementos.


No âmbito da teologia, os dicotomistas acreditam que o ser humano é dividido em duas partes: corpo e alma. Para eles, alma e espírito são sinônimos. Por outro lado, os tricotomistas contemplam o ser humano em três vertentes: corpo, alma e espírito. Os filósofos gregos acreditavam que o corpo estava a serviço da alma, que era submissa aos interesses divinos.


No contexto do direito, muitos autores abordam a dicotomia entre direito público e privado. Na música, ela se expressa entre a erudita e a popular. Na politica, entre esquerda e direita. Até existem algumas pessoas que acreditam em centro.


O linguista suíço Ferdinand de Saussure abordou quatro dicotomias: sincronia e diacronia, língua e fala, significado e significante, sintagma e paradigma.


Em botânica, também acontece a dicotomia, quando há divisão de uma célula em duas e cada uma dá origem a outras células. Ainda na botânica, a tricotomia indica um órgão de uma planta que é subdividido em três.


Os visitantes de uma nova exposição da Royal Academy of Arts de Londres, na Inglaterra, devem se espremer de lado entre dois modelos nus para entrar na mostra. A instalação inusitada faz parte de uma retrospectiva da carreira da artista sérvia Marina Abramović, que abre neste sábado para o público e vai até o dia 1º de janeiro de 2024.

A performance, intitulada Imponderabilia, foi encenada pela primeira vez em 1977. Na ocasião, foi a própria Marina e seu então parceiro, o artista alemão Ulay, que ficaram juntos e pelados em uma porta, obrigando os visitantes da mostra à época a passarem entre eles. O conceito do trabalho era explorar a ideia do “artista como porta para o museu”.


Passar entre os dois artistas nus força os visitantes a um “confronto entre a nudez e o gênero, a sexualidade, o desejo”, disse a curadora Andrea Tarsia, chefe de exposições da Royal Academy, à BBC.


SOMOS IGUALDADE OU DIVERSIDADE?


Pensamos e criamos uma sociedade com codificações embasadas na igualdade. Mas se a diversidade é nossa maior igualdade enquanto humanidade – e se somos quase 8 bilhões de diversidades – como praticar igualdade sem pensar antes em equidade? Como lutar por meritocracia com tantos abismos que nos separam e distanciam? Como fazer com que igualdade, meritocracia e responsabilidade social não sejam fake news?

Independente de dicotomias, tricotomias ou mais segmentações, não podemos nos limitar quando falamos sobre seres humanos. Somos múltiplos, plurais e mutantes.


Limite é bom no cartão de crédito e quando não temos dinheiro. Pessoas nasceram para serem horizontes, não fronteiras.


Um dos maiores erros de quando trabalhamos com pessoas e para pessoas dentro das empresas é engessar colaboradores em códigos de conduta únicos, decididos somente por poucas pessoas da alta liderança. É novamente o sistema impondo suas regras e condicionamentos.


E sabemos que quando o sistema não é pensado de modo plural será enviesado e atravessado por preconceitos e, consequentemente, discriminações várias. Reduzir pessoas a uma única ou poucas características tira a potência da real diversidade que todos somos.


Castramos pessoas em dress codes, em maneiras de executar tarefas em equipe e fazer entregas, em não criar espaços saudáveis e com escuta ativa, em prendê-las em grupos de afinidades, letras identitárias e muito mais.


Não que você não possa criar ferramentas e caminhos para amadurecimento e conhecimento cada vez maior de suas realidades e vivências. Mas perceba: caminho. E caminho não é fim. Não pode ser ponto final.


BEM E MAL É TUDO IGUAL


A frase não é minha, mas poderia. É de Shakespeare, dita em Macbeth. Quem decidiu o que é um ou outro? Ou quem é bom e mau? Ou você acredita que todos esses conceitos são naturalmente e divinamente criados e imputados em nosso DNA?

Pensar de modo mais holístico e menos fragmentado permite entender que precisamos avançar muito no que diz respeito à nossa própria humanidade. Esse é o caminho para parirmos a sociedade que desejamos. Somente sendo uma humanidade melhor, teremos sociedade e até empresas melhores.


A melhor empresa em termos de normativas, códigos de conduta e compliance, se não encontra respaldo nas práticas cotidianas das pessoas colaboradoras que a compõem, não conseguirá ser uma empresa humanizada, que respeita sua diversidade. Estará longe do tal “Walk the talk” que tanto ouvimos falar e pouco conhecemos na realidade.

Agora diz para mim: na exposição da Royal Academy você passaria de frente para quem? De costas para quem? Ou nem passaria? Ou passaria mais de uma vez, testando as possibilidades? E se você também precisasse estar sem roupas – sendo exatamente quem você é, em sua essência mais nua e crua – isso mudaria as respostas que dei para as perguntas acima?


As dicotomias te trazem conforto ou desespero? Te deixam confortáveis ou desconfortáveis? E as zonas de conforto? Que sentimentos te trazem? E as instabilidades da vida, cada vez mais acentuadas neste mundo BANI (frágil, ansioso, não linear e incompreensível, na sigla em inglês)?


Não precisa ter as respostas agora, mas se não começar a pensar sobre as suas certezas, não tenho dúvidas, te deixará cada vez mais distante da sua melhor versão.


Texto escrito para a coluna Gênero e Número - acesse todos os artigos de Maite Schneider indo em https://www.generonumero.media/author/maite-schneider/

 

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