A relação entre trabalho e maternidade é um dos maiores desafios das mulheres em suas carreiras e ainda traz um peso gigantesco de insegurança para a grande maioria delas. Na maior parte das empresas e companhias, vemos, mesmo que de modo inconsciente, a maternidade como um problema e a paternidade como um apoio – o que é reflexo também das leis que abordam o tema.
Além disso, aparecem o conflito entre vida profissional e pessoal, os estereótipos, a exaustão, as mudanças no horário de trabalho e a falta de oportunidades de crescimento na carreira.
A licença maternidade nasceu em 1943. Na época, falava-se que a empregada gestante poderia se afastar do trabalho por quatro semanas antes do parto e mais oito semanas após a chegada do bebê. Com a Constituição cidadã de 1988, a maternidade passou a ser um direito social e a licença foi ampliada para 120 ou 180 dias (se a empresa estiver devidamente cadastrada no Programa Empresa Cidadã).
Por outro lado, temos a CLT, que prevê cinco dias de licença paternidade obrigatória. Com a sanção da Lei 13.257, em 2016, ficou definido que a licença paternidade poderia receber um acréscimo de 15 dias, totalizando 20 dias para funcionários de empresas cadastradas no Programa Empresa Cidadã.
Mas as configurações familiares vêm mudando. Com a legalização do casamento e da adoção por casais homoafetivos, o crescimento no número de pais solo e a possibilidade de gestação por pessoas trans, a ideia de família nuclear e tradicional já não é uma regra. Então, se queremos empresas realmente mais humanizadas, temos que pensar para além do que é colocado no corpo legal, enquanto ainda não temos leis que acompanhem essa amplitude e essas práticas.
Alguns pontos a serem levados em consideração:
22 mil empresas estão inscritas no Programa Empresa Cidadã, somente 16% das que poderiam ser elegíveis
Pesquisa da FGV aponta que 48% das mulheres são demitidas após licença maternidade e mostra que o número de demissões é mais baixo conforme aumenta a senioridade da função. Além da chance de demissão, as mulheres também ficam suscetíveis a salários mais baixos e menores chances de reconhecimento ou promoções.
Cerca de um a cada quatro profissionais com filhos já foi questionado pelo líder quando teve que resolver alguma demanda familiar durante o expediente (mulheres são quase quatro vezes mais questionadas que homens). Resultado? Mais de 70% dos respondentes tiveram de mentir para conseguir atender à demanda familiar.
80% das mães brasileiras declaram estar exaustas ao conciliar filhos, rotina doméstica e trabalho. Entre os pais, o índice vai para 48%
68% das mães que trabalham são afetadas pela síndrome de burnout
Com esses dados, podemos perceber o quanto é urgente pararmos de achar que a questão de filhos (as/es) é um problema e partirmos para soluções. Quando falamos de Diversidade, Equidade, Inclusão e Pertencimento, falamos de HUMANIDADE. Afinal, independente do ramo de atividade, tamanho de sua empresa e tipo de serviços/produtos oferecidos, ela é constituída por pessoas. E, na outra ponta, consumida, 100% das vezes, por pessoas. Melhorar os processos e deixá-los cada vez mais humanos é condição indispensável para a construção do mundo melhor que desejamos.
De acordo com a pesquisa realizada pela Right Management em 15 países, entre eles o Brasil, investir na saúde e no bem-estar do colaborador pode aumentar a produtividade em até 50%. Também empresas que contam com pelo menos 30% dos cargos de liderança ocupados por mulheres registraram uma lucratividade 6% maior do que as outras. Certamente, boa parte dessas mulheres tem ou planeja ter crianças.
Deixo alguns caminhos interessantes, já desenvolvidos por empresas que estão liderando estas construções com ótimo resultados:
Regime de tempo parcial
Banco de horas
Jornada de 12 horas trabalhadas por 36 horas ininterruptas de descanso
Antecipação de férias individuais
Horários de entrada e de saída flexíveis.
Preferência para o teletrabalho
Licença parental universal de 6 meses
Benefícios como criação de um espaço família, com área para amamentação; auxílio-creche; auxílio-material escolar; oferta de atividades lúdicas e pedagógicas para as crianças; assistência financeira ou serviço de apoio para o cuidado de crianças; sala de apoio ao aleitamento
Retirada de coparticipação de procedimentos do plano de saúde para pré natal e após nascimento por tempo determinado
Reembolso (mesmo que parcial) de remédios utilizados pela criança
Letramentos constantes e grupos de afinidades plurais que sejam espaços de escuta e trocas sobre temas como masculinidade saudável, protagonismo paterno no cuidado da criança, maternidade e paternidade como celeiros de potentes habilidades sócio-emocionais (multitarefas, criatividade, gerenciamento de crises e tempo, adaptabilidade, empatia, inovação, trabalho em equipe, resiliência)
Claro que tudo pode ser pensado, ampliado e construído de acordo com a sua cultura organizacional. Por isso é tão importante que escutemos as pessoas colaboradoras nessa construção.
Para finalizar, quero divulgar o excelente material da MAMG Advogados, que disponibilizou sua própria política de parentalidade, com objetivo de “espalhar essas ideias e multiplicar iniciativas”. Um bom caminho para você ampliar seu olhar e criar novos horizontes.
E você? Que outras possibilidades tem visto e experimentado? Me conta?
Texto escrito para a coluna Gênero e Número - acesse todos os artigos de Maite Schneider indo em https://www.generonumero.media/author/maite-schneider/
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